Autora recusou vacina devido ao câncer, mas depois alegou convicções pessoais.
Sem constatar justo motivo para a recusa à vacinação contra a Covid-19, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, na 3ª Vara do Trabalho de Mauá (SP), autorizou a continuidade de um processo administrativo disciplinar (PAD) da prefeitura contra uma dentista, que é funcionária pública municipal.
No último ano, a prefeitura do município da Grande São Paulo passou a exigir a imunização para a continuidade da prestação dos serviços. A dentista não tomou a vacina e justificou tal medida com seu diagnóstico de câncer de mama.
Na ação trabalhista, ela solicitou retorno imediato ao serviço e pediu que a prefeitura deixasse de computar como faltas injustificadas o período em que não pôde exercer suas funções. Inicialmente, o Juízo determinou a suspensão da tramitação do PAD instaurado contra a autora.
Recomendações médicas
Em nova decisão, a juíza substituta do TRT da 2ª Região Tatiane Pastorelli Dutra observou que a justificativa da dentista para a recusa não tinha base científica. O laudo pericial mostrou que a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (Sboc) e a Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim) não contraindicam a vacina para pacientes de câncer — pelo contrário, defendem sua inclusão no grupo de risco, independentemente da fase da doença.
Segundo a Sboc, pessoas recém-diagnosticadas com câncer devem ser imunizadas antes de iniciar o tratamento, preferencialmente. Porém, ressalta que mesmo os pacientes em tratamento ativo devem ser vacinados contra a Covid.
A perícia também indicou que o Instituto Nacional de Câncer (Inca) não se opõe à vacinação de pacientes em investigação de câncer de mama. O órgão apenas alerta para a possibilidade de aumento dos nódulos linfáticos logo após a aplicação do imunizante, e por isso sugere que exames de mamografia sejam feitos entre quatro e seis semanas após a vacinação.
Pastorelli destacou que a dentista não trouxe aos autos "qualquer literatura médica capaz de contrariar o laudo", nem mesmo apontou "erro em seu conteúdo ou metodologia".
Negacionismo detectado
Na visão da juíza, a autora usou seus exames clínicos para camuflar sua verdadeira intenção: recusar o imunizante por suas próprias crenças. Isso porque a dentista confessou ao perito que "por convicções pessoais decidiu não tomar a vacina" e que não houve contraindicação de sua médica. Ela disse ter recusado por não ser "cobaia" e não querer usar uma droga que não conhece.
A magistrada apontou que a trabalhadora "nada conhece sobre vacina", pois "não é imunologista" e não "participou das diversas e rigorosas fases de estudos para o desenvolvimento dos imunizantes". Porém, destacou que ela deveria "buscar se informar com quem sabe", pois cientistas "qualificados e de renome nacional e internacional" já atestaram sua segurança e eficácia.
Tatiane Pastorelli ainda ressaltou a contradição da dentista: "Certamente, a reclamante não conhece os detalhes dos instrumentos tecnológicos (computador ou celular) pelo qual lê esta sentença, tampouco entende das minúcias da nanotecnologia ou transmissões de onda de alta frequência que a permite estar conectada a todo tempo à rede mundial de computadores (internet). Mas, ainda assim, faz uso despreocupado de seus aparelhos tecnológicos". Com informações da assessoria de imprensa do TRT-2.
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Processo 1000649-75.2022.5.02.0363
Fonte: ConJur
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